terça-feira, 24 de junho de 2014

Epilepsia e trabalho: Um olhar para além da condição de saúde

Epilepsia e trabalho: Um olhar para além da condição de saúde

Lauren Machado Pinto
Terapeuta Ocupacional
Mestre em Medicina Interna pelo Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná

Carlos Silvado
Médico Neurologista
Serviço de Epilepsia do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná

Pessoas com epilepsia, além da existência das crises epilépticas, convivem com diversas restrições ligadas às relações interpessoais, familiares e sociais¹. Neste sentido, estima-se que pessoas com epilepsia podem apresentar taxa de desemprego duas vezes maior que pessoas sem epilepsia², o que pode estar associado, além da própria condição de saúde, com a recorrência de crises, vivência de situação estigma e preconceito, baixa qualificação profissional e efeitos colaterais de medicamentos. Tal indicador pode gerar impactos de ordem psicossocial e na qualidade de vida³. 

Neste sentido, na compreensão da complexidade do problema, observa-se que é necessário um olhar sobre a funcionalidade do sujeito que vá para além da condição de saúde (epilepsia). Ao analisar a participação de pessoas com epilepsia no trabalho, fatores ligados ao sujeito, ao ambiente e a própria tarefa devem ser levados em consideração4. A Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) corrobora com este olhar, uma vez que descreve a funcionalidade a partir da perspectiva de como a condição de saúde, funções e estruturas do corpo, e os fatores ambientais e pessoais, integrados, repercutem nas possibilidades de participação do sujeito em atividades significativas para si. Na perspectiva da epilepsia, a CIF pode ser um instrumento útil para a elaboração de indicadores, planejamento de ações em saúde e análise do diagnóstico situacional dos indivíduos, tendo em vista que utiliza uma linguagem unificada e universal5.  


Neste sentido, observa-se que no quesito da participação de pessoas com epilepsia no trabalho, se faz necessário a compreensão das condições de vida da pessoa com epilepsia para além da lógica linear diagnóstico – incapacidade. O desafio da análise das particularidades perpassa uma lógica individualizada que favoreça projetos terapêuticos singulares e estruturação de linhas de cuidado, com trabalho em rede e equipe interdisciplinar com foco na otimização da funcionalidade dos sujeitos. Estudos e ensaios intervencionistas com o olhar ampliado, no modelo biopsicossocial proposto pela CIF, favorecem esta perspectiva. 

Referências bibliográficas

1. Dourado M.V. et al. Quality of Life and the Self-Perception Impact of Epilepsy in Three Different Epilepsy Types. J Epilepsy Clin Neurophysiol. 2007; 13:191–6.
2. Clarke, B.M.; Upton, A.R.; Castellanos, C. Work beliefs and work status in epilepsy. Epilepsy & Behaviour. 2006; 9: 119-25.
3. Quintas, R. et al. Psychosocial difficulties in people with epilepsy: A systematic review of literature from 2005 until 2010. Epilepsy & Behaviour. 2012; 25: 60-67.
4. Smetts, V.M. et al. Epilepsy and employment: literature review. Epilepsy & Behaviour. 2007; 10: 354-62.
5. Farias, N. Buchalla, C.M. A Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde da Organização Mundial de Saúde: Conceitos, usos e perspectivas. Rev. Bras. Epidemiol. 2005; 8: 187-93.



Trabalhador com epilepsia é reintegrado após demissão sem justa causa
A Louis Dreyfus Commodities Brasil S.A terá de reintegrar a seu quadro um empregado com epilepsia
demitido sem justa causa 20 dias depois de retornar ao trabalho após o termino de auxílio doença. Graças a
uma tutela antecipada da Justiça Federal que garantiu o restabelecimento do benefício, ele comprovou que
estava inapto para ser demitido.

A empresa perdeu a ação em todas as instâncias da Justiça do Trabalho da 23ª Região. O agravo de
instrumento pelo qual pretendia trazer o caso à discussão no Tribunal Superior do Trabalho foi desprovido
pela Sexta Turma, e o processo já transitou em julgado, não cabendo mais recursos.

No processo, consta um atestado emitido por neurologista em outubro de 2010 descrevendo que o
trabalhador, auxiliar de pátio da Louis Dreyfus em Rondonópolis (MT), apresentava quadro de epilepsia
de difícil controle em fase de ajuste de dose e troca de medicação, sendo necessário afastamento do
trabalho "por tempo indeterminado". O afastamento durou até abril de 2011, quando o INSS suspendeu o
auxílio doença e, em maio de 2011, ele foi demitido. Após passar pelo exame demissional, um atestado de
saúde ocupacional declarou-o "apto para o trabalho".

Na reclamação trabalhista, ele pediu a declaração de nulidade da rescisão contratual e indenização por
danos morais, no valor de R$ 31 mil. Segundo ele, houve "falta de boa-fé" da empresa ao dispensálo
mesmo tendo conhecimento de seu quadro clínico e "mesmo sabendo que com a demissão ficaria
completamente desamparado e sem condições de dar sequência no tratamento".

Readmissão

A juíza da 1ª Vara do Trabalho de Rondonópolis determinou a readmissão. De acordo com a sentença,
embora na data da dispensa o trabalhador estivesse em alta previdenciária, a documentação trazida por
ele demonstrou que o tratamento estava em andamento por tempo indeterminado. O último atestado foi
dado durante o aviso prévio indenizado, que integra o contrato de trabalho, e o benefício previdenciário foi
restabelecido pela Justiça Federal em novembro de 2011 com efeito retroativo. Além disso, o perito afirmou
que, no momento da dispensa, o auxiliar estava doente.

O Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região (MT) manteve a sentença e negou seguimento a recurso da
empresa, levando-a a interpor agravo de instrumento. Em sua defesa, a Dreyfus afirmou que, no momento
da dispensa, o trabalhador não estava protegido por nenhum atestado médico e em alta previdenciária.
Assim, a decisão que determinou a readmissão contrariava o poder diretivo da empresa.

Para o relator do agravo, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, ficou evidenciado que o trabalhador não estava
apto para ser dispensado, pois ainda necessitava de tratamento médico e afastamento do trabalho para
essa necessidade, estando incapacitado total e permanentemente para atividades de risco, e total e
temporariamente para outras atividades. "Nesse contexto, não há como se concluir pela alta previdenciária,
especialmente em razão da decisão da Justiça Federal determinando o restabelecimento do auxílio doença
e da prova pericial", concluiu. A decisão foi unânime.

Processo: AIRR-177-17.2012.5.23.0021
(Paula Andrade e Carmem Feijó)
O TST possui oito Turmas julgadoras, cada uma composta por três ministros, com a atribuição de analisar recursos de
revista, agravos, agravos de instrumento, agravos regimentais e recursos ordinários em ação cautelar. Das decisões das
Turmas, a parte ainda pode, em alguns casos, recorrer à Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SBDI-1).
Esta matéria tem caráter informativo, sem cunho oficial.
Permitida a reprodução mediante citação da fonte.
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Tribunal Superior do Trabalho
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Epilepsia e Trabalho: Limites e possibilidades

Este título não foi selecionado aleatoriamente, pois a pessoa com epilepsia conhece assim que a enfermidade é diagnosticada seus limites. É importante ressaltar que suas potencialidades são invisíveis. O que pode ser observado é um forte discurso da medicalização, uma tentativa da sociedade de controlar os corpos e as mentes dos sujeitos com epilepsia.

Neste texto especificamente o assunto a tratar é a inclusão da pessoa com epilepsia no mercado de trabalho. Este debate ainda é muito superficial sempre colocando como alternativa o trabalho autônomo. A questão a ser pontuada não se trata da exclusão do trabalho autônomo como opção de sobrevivência na vida dos indivíduos com epilepsia. Esta atividade inclusive deve ser estimulada, realizando parcerias com escolas técnicas, de empreendedorismo, economia solidária, etc. portanto, a inserção da pessoa com epilepsia como trabalhador autônomo deve ser uma opção e não uma única alternativa. É fundamental que a pessoa com epilepsia tenha o direito de ser incluída de modo efetivo no mercado formal de trabalho. Para isso, precisam ser garantidas políticas como:

1 – qualificação dos médicos peritos entendendo as habilidades da pessoa com epilepsia para o mercado de trabalho;
2 – carga-horária de acordo com as possibilidades de cada indivíduo, tendo como foco a gravidade da doença, quantidade de medicamento entre outros comprometimentos que podem ser trazidos pela epilepsia.
O edital deve prever de cinco a vinte por cento das vagas tendo que ser comprovado em laudo médico acompanhado de eletroencefolograma, dando mais seriedade às cotas.
4 – As empresas privadas também devem , a partir de cem empregados, ser obrigadas a contratar pessoas com epilepsia na seguinte proporção: acima de cem 1 empregado, acima de 200, 2 empregados de mais de mil empregados, até cinco pessoas com epilepsia.

Essas cotas não têm como objetivo colocar a pessoa com epilepsia como deficiente. A proposta atuará como ação afirmativa, possibilitando, deste modo, maior inserção da pessoa com epilepsia no mercado formal de trabalho e na academia, assim como está acontecendo com os afrodescendentes.

As pessoas com epilepsia precisam aparecer nas mídias, ter o direito de contar, quando são empregadas, que possuem esta doença, porém, muitas vezes, isto não é feito por medo de ser demitida. Quando comentam que têm epilepsia, muitas vezes as empresas, de forma sutil, as demitem. Por isso, mais uma vez, as cotas atuarão como um instrumento de ação afirmativa no trabalho e nas universidades, melhorando a qualificação desses sujeitos.

O mercado informal não deve, como já foi informado anteriormente, ser esquecido.
A pessoa com epilepsia deve pagar um preço irrisório para ter acesso a cursos ofertados por estes locais. Desta maneira a qualificação para o trabalho informal acontecerá de maneira mais eficiente, melhorando a renda e, conseqüentemente, a qualidade de vida.

Este texto propôs formas significativas de inclusão no mercado formal e informal de trabalho. Trata-se da saída do discurso médico, da aposentadoria, para efetiva inserção no trabalho seja de ambas as formas, desde que a pessoa com epilepsia tenha o direito de escolher em qual setor deseja atuar.

Texto elaborado por um membro associado da AMAE – Associação Mineira de Epilepsia



segunda-feira, 23 de junho de 2014

I Congresso Brasileiro de Autismo Aplicado ao SUS

I Congresso Brasileiro de Autismo Aplicado ao SUS

Uma em cada cinco crianças autistas tem epilepsia

Foi aprovado no Encontro Nacional, realizado em Foz do Iguaçu, que a EPIBRASIL buscasse relacionamento com entidades afins, participando de eventos para divulgar a causa da epilepsia. 

Assim, nossa companheira, Ruth Jorge participou do I Congresso Brasileiro de Autismo Aplicado ao SUS, realizado em São Paulo, no Memorial da América Latina, nos dias 30 e 31 de maio de 2014. Nossos agradecimentos a esta companheira que deixou seus afazeres habituais para participar deste grande evento e contribuir para a divulgação da causa da epilepsia. Abaixo, o relato de Ruth:

Foi um evento de grande magnitude, organizado pela ONG Autismo e Realidade, com apoio do Ministério da Saúde, da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, da Secretaria de Estado da Pessoa com Deficiência, contando com público de mais de 500 pessoas de vários estados brasileiros, dentre pais, técnicos da saúde, universitários, além de representantes de todas as esferas governamentais. O principal objetivo do evento foi o de definir metas, estratégias e ações na temática do autismo a nível nacional para os próximos 5 anos.

Palestrantes de expressão nacional e internacional trouxeram resultados de suas experiências em vários segmentos, bem como resultados de pesquisas científicas atuais que ainda não foram publicados. Representantes do Ministério da Saúde, do governo do Estado de São Paulo nas áreas da saúde e educação, representantes do município de São Paulo e da Secretaria da Pessoa com Deficiência e representantes de CAPS relataram algumas providências, a exemplo da publicação do protocolo de atendimento ao autista lançado este ano pelo governo do Estado de São Paulo. 

Também estiveram representados o Comitê Nacional para Estudos dos Transtornos do Espectro Autista, criado por decreto pelo Ministério da Saúde e o Primeiro Centro de Referência em Autismo, de iniciativa do governo do Estado de São Paulo e que em breve estará em pleno funcionamento. Foi também referendada a cartilha sobre autismo de assinatura do Ziraldo, lançada pelo Ministério da Saúde. 

Este é apenas um breve relato do evento, que poderá ser consultado através do site www.autismoerealidade.org, onde o conteúdo dos slides apresentados pelos palestrantes estará disponível aos interessados.

Pesquisas recentes apontam a incidência de 1 caso de autismo para cada grupo de 88 crianças (média) na faixa etária de 7 a 12 anos , sendo 5 meninos para 1 menina e 22% com epilepsia ativa, constituindo portanto matéria de relevância para a EPIBRASIL.
Nós temos consciência da situação das pessoas com epilepsia em nosso país. O tratamento equivocado que a grande maioria recebe traz como consequência a piora no quadro geral, especialmente aqueles com síndromes correlatas e comorbidades.

Os avanços conquistados pela população com autismo devem-se á mobilização de seus pais, batalhas junto aos conselhos de saúde, educação, assistência social, Ministério Público, manifestações de rua, enfim - eles não se calaram !!!

Creio ser um grande exemplo e até um estímulo para que prossigamos em nossas lutas, mesmo sabendo que perderemos algumas batalhas, mas também venceremos outras.

A vida se renova a cada dia e nossas necessidades também mudam, assim, a luta por novas conquistas deve ser permanente.

Saúdo a todos
Um grande abraço

Ruth Jorge 
Associação Pró Portadores de Epilepsia e Síndromes Convulsivas – APPESC
São Paulo – SP / www.appesc.org.br

domingo, 22 de junho de 2014

Canabidiol e epilepsia: usar ou não usar?

Canabidiol e epilepsia: usar ou não usar?

Texto compilado por Maria Carolina Doretto
Presidente da EPIBRASIL – Federação Brasileira de Epilepsia


Parte 1: O uso do canabidiol no tratamento de epilepsias graves de difícil controle
Nunca na história recente houve tanto interesse e discussão pública sobre o uso potencial da maconha (Canabis sativa e Canabis indica) e de um de seus princípios ativos, o canabidiol (CBD) no tratamento de várias condições neurológicas tais como dor crônica e esclerose múltipla e ultimamente para o tratamento de epilepsias refratárias e as chamadas epilepsias catastróficas tais como a síndrome de Dravet, de Rett e de Lennox-Gastaut. Pacientes e familiares no mundo todo perguntam a seus médicos se este é um tratamento que pode ser utilizado e pais de crianças com epilepsias graves alimentam a esperança de ver seus filhos socorridos pelo CBD, a exemplo do que ocorreu no caso Charlotte Figi, nos Estados Unidos e de Anny em Brasília - DF. Charlotte apresentava crises prolongadas de status epilepticus, crises tônico-clônicas generalizadas e crises mioclônicas, totalizando mais de 50 crises por dia. Ela foi diagnosticada com síndrome de Dravet, uma doença associada a mutação genética,  Recebeu todos os tratamentos farmacológicos possíveis e dieta cetogênica sem resultados. Anny sofre de síndrome de CDKL5, uma variante da síndrome de Rett, com crises epiléticas frequentes e de difícil controle, causada também por mutação genética. Apresentava 60 convulsões por semana e nenhum tratamento foi efetivo. Estas duas crianças foram tratadas com CBD com excelentes resultados. Charlotte, após 29 meses de tratamento, apresenta 2 ou 3 crises tônico-clônicas generalizadas noturnas por mês, alimenta-se por via oral – por si mesma, dorme tranquilamente a noite toda e seus comportamentos autistas (auto-mutilação, agressividade, comportamento de auto-estimulação, pobre contato visual e pobre interação social), também melhoraram. Ela voltou a falar e a andar. Anny também melhorou. Recuperou a fala e a atividade motora e passou a ter 3 crises por semana. Corroborando os achados clínicos verificados nestas crianças, recente consulta feita com pais sobre o uso do CBD mostrou que para a maioria dos filhos com síndrome de Dravet houve uma redução de mais de 80% das crises, melhora nos níveis de atenção e não foi relatado nenhum efeito colateral grave. Alguns relataram tontura e fadiga.

Parte 2: Porque utilizar os derivados da maconha para tratar epilepsia? 
A Canabis sativa tem uma longa história de uso na medicina, com os primeiros documentos datados de 4000 A.C., na China, para o tratamento de reumatismo, dor e convulsões. De fato, a canabis esteve disponível em farmácias nos Estados Unidos para tratar várias doenças até 1941, mas depois seu uso foi suspenso e tornou-se ilegal em 1970. Alguns poucos relatos de caso sugerem atividade anticonvulsivante para o D9-tetrahidrocanabinol (THC), mas os efeitos colaterais psicotrópicos limitaram seu uso (4, 5). Em 1973, o Professor Elisaldo Carlini (6), um pesquisador brasileiro, demonstrou pela primeira vez, em animais de laboratório, os efeitos anticonvulsivantes do CBD, sem qualquer toxicidade e ausência de efeitos psicotrópicos. Em 1980, Cunha e colaboradores (7) realizaram um estudo controlado em 15 pacientes que receberam CBD ou placebo, além das medicações que já tomavam. Quatro de 8 pacientes ficaram “quase livres” de convulsões, 3 demonstraram “melhora parcial” e um dos 8 não apresentou melhora. No grupo placebo somente um paciente mostrou melhora nas crises.  Pesquisas em animais de laboratório têm proporcionado fortes evidências em relação à segurança e às propriedades anticonvulsivantes do CBD. Entretanto, a falta de compostos puros, farmacologicamente ativos e as restrições legais têm dificultado as pesquisas clínicas em seres humanos e os dados sobre o uso têm ficado restritos a relatos isolados. 
Parte do desafio em compreender porque a maconha apresenta efeitos aparentemente contraditórios em epilepsia, deve-se provavelmente à complexidade da própria planta. A Cannabis sativa tem 489 constituintes conhecidos (1) 70 dos quais são canabinóides e o restante inclui substâncias que são potencialmente neuroativas e que são capazes de atravessar a barreira hemato-encefálica. A estrutura química do THC e do CBD foram determinadas em 1963 (2) Estes dois derivados da maconha têm atraído grande interesse na pesquisa como terapias potenciais para a epilepsia. Relatos isolados e circunstanciais, também chamados de “anedóticos” em seres humanos sobre o uso do CBD em pacientes com síndrome de Dravet e de Lennox-Gastaut (3) foram realizados com produtos contendo primariamente CBD, frequentemente com uma alta proporção CBD:THC, da ordem de 20:1. Baseado no sucesso do caso de Charlotte, foi criada nos Estados Unidos uma organização sem fins lucrativos para encaminhar as necessidades de outros pacientes com síndromes epilépticas catastróficas para ajudá-los a ter acesso a uma maconha de alta qualidade, testada em laboratório, com alto conteúdo de CBD. Mais de 200 pacientes estão sendo tratados desde o início de 2014. Entre os canabinóides, o CBD puro parece ser um ótimo candidato para ser utilizado em pacientes com epilepsia refratária. A ausência do THC e, portanto, dos riscos associados ao uso de maconha em crianças e jovens (8, 9) e seu excelente perfil de segurança em humanos bem como sua eficácia em estudos pré-clínicos sugerem que o CBD pode ser uma droga segura e efetiva para tratar epilepsia.


sábado, 21 de junho de 2014

Carta para Chico César

FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE EPILEPSIA

Vespasiano - MG, 20 de junho de 2014.
Exmo. Sr.
Francisco César Gonçalves – “Chico César”
Secretario de Estado da Cultura da Paraíba
João Pessoa - PB

Prezado Sr. Francisco César


Com nossos cordiais cumprimentos, vimos, em nome de 4 milhões de pessoas com epilepsia no Brasil, comentar seu poema, criado por ocasião da abertura da Copa do Mundo, no dia 12 de junho.

Em que pese sua intenção, legítima e louvável, de defender a autoridade máxima do país, a Presidente Dilma Roussef, a parte de seu poema que faz referências aos “epilépticos”: 

"os vaiantes em seu estertor espamódico
mostram-se esquizofrênicos e epilépticos morais
espumando com suas bocas tortas na tv
suas barrigas
suas chapinhas
seus stick lips para manter brilhante o botox labial” ....
é ofensiva, preconceituosa e desqualificadora para este enorme contingente de brasileiros.

Para seu conhecimento, informamos que a epilepsia é uma doença não contagiosa, caracterizada por crises epilépticas repetidas. Ela se manifesta em pessoas de todas as idades, sendo mais frequente entre crianças e idosos, por serem mais vulneráveis a infecções, acidentes e doenças, cujas complicações podem causar crises epilépticas. A epilepsia é agravada pela pobreza, devido à precariedade do sistema de saúde e à grande incidência de doenças infecciosas nas camadas mais pobres da população. A maior parte das pessoas com epilepsia, mesmo tendo qualificação profissional, está fora do mercado formal de trabalho, devido ao estigma e ao preconceito que são as principais barreiras para que possam exercitar seus direitos humanos e a integração social. Os “epilépticos”, que para nós são “pessoas com epilepsia” estão em sua maioria, abandonadas pelo poder público: não há políticas públicas para atenção à saúde destas pessoas e tampouco para sua integração social. 

Surpreende-nos, que um artista de seu porte, músico de alta qualificação, compositor, jornalista formado por uma Universidade Federal, ex-diretor executivo da Fundação Cultural de João Pessoa, com vivências em países desenvolvidos, que ocupa o cargo de Secretário de Estado, tenha posição tão preconceituosa e tão triste, não só em relação às pessoas com epilepsia, mas também em relação àqueles que têm a infelicidade de padecer de uma doença mental tão avassaladora, como é a esquizofrenia, e que acomete outros tantos milhões de brasileiros.

Assim, vimos convidá-lo, como homem público que é, a modificar seus conceitos e suas atitudes em relação aos fatos supra-mencionados e integrar-se como colaborador, ao movimento nacional da epilepsia. Nosso trabalho consiste basicamente em combater o estigma e o preconceito que cercam os pacientes, levar à sociedade informações corretas sobre a doença e orientar sobre tratamentos adequados, proporcionando assim melhoria na qualidade de vida destas pessoas. Atuamos também junto ao poder público, nas três esferas, com o objetivo de garantir atenção integral à saúde destas pessoas.

Na certeza de que o Sr. Fará uma reflexão sobre estes fatos, e quiçá, uma retratação pública, agradecemos sua atenção e subscrevemo-nos, 


Cordialmente, 


Maria Carolina Doretto
Presidente da EPIBRASIL – Federação Brasileira de Epilepsia
Contatos: 31- 3622-8140 / 9718-4508
http://www.epilepsianet.blogspot.com.br/